Uma liderança da saúde dentro do Partidão
Acostumado a discutir questões centrais da polÃtica brasileira desde muito jovem, Sergio Arouca começou a militar no antigo Partido Comunista do Brasil (PCB) em 1956, quando ainda tinha 15 anos. O momento era de instabilidade interna provocada pelo suicÃdio de Getúlio Vargas dois anos antes. O PCB buscava reformular sua linha ideológica de acordo com a nova ordem do paÃs e passou a considerar melhor a importância da democracia. Dentro dessa autocrÃtica, o partido aprovou um documento que defendia o caminho pacÃfico e rejeitava a insurreição armada.
No inÃcio dos anos 60, uma conferência nacional do PCB aprovou o novo estatuto que alterava o nome da organização para Partido Comunista Brasileiro, popularmente conhecido como Partidão. Arouca, que cursava medicina na Universidade de São Paulo (USP) nessa época, usava o centro acadêmico como uma forma de expressar sua veia polÃtica, já certo de que iria orientar sua carreira profissional para essa área. Com a renúncia do presidente Jânio Quadros, o PCB lutou pela garantia da posse do vice-presidente João Goulart em 1961, mas não teve como evitar as forças que se articulavam em direção ao golpe de 1964.
De acordo com a ideologia polÃtica do PCB, Arouca se incorporou à tarefa de lutar contra a ditadura por meios pacÃficos. A proposta era conquistar a anistia polÃtica e as liberdades democráticas de organização e de expressão. Os comunistas também batalhavam pelas eleições diretas em todos os nÃveis de governo e pela convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte.
Com a imposição do AI-5, entre 1968 e 1972, a repressão se acentuou e a atuação do PCB foi dificultada. Nessa época, o partido também sofria pressões de outras organizações de esquerda, que discordavam do caminho pacÃfico, optando por atos ousados, como assaltos, seqüestros e luta armada.
O fim da ditadura trouxe novos ânimos para os comunistas, apesar da derrota no Congresso Nacional da emenda a favor das eleições diretas. O PCB foi o único partido de esquerda que apoiou o pleito indireto, realizado pelo Colégio Eleitoral em janeiro de 1985. Nessa época, Arouca já representava uma liderança importante no Rio de Janeiro, o que culminou na vitória de sua candidatura à presidência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em março. Em maio do mesmo ano, o PCB ganhou sua legalidade.
Em novembro de 1986, Arouca foi nomeado secretário de Estado da Saúde do Rio de Janeiro pelo então governador Moreira Franco. Pressionado a deixar a presidência da Fiocruz, o que acreditava ter sido motivado por sua ligação com o PCB, o médico optou por continuar nos dois cargos e abriu mão dos vencimentos de secretário. Na secretaria até 1988, ele priorizou o controle do comércio de sangue e a realização de campanhas de prevenção e combate a doenças endêmicas como o dengue, linhas ideológicas que acompanharam sua trajetória polÃtica.
Liderança indiscutÃvel entre os sanitaristas, Arouca teve um papel fundamental na defesa do acesso universal e gratuito aos serviços de saúde na Assembléia Nacional Constituinte de 1987/88, o que culminou na regulamentação da lei orgânica da saúde. Nesse processo de mudanças, o PCB foi um dos poucos partidos que apresentou propostas completas sobre as principais questões que seriam analisadas pelos constituintes.
Em abril de 1989, Arouca se afastou da presidência da Fiocruz para se candidatar à Vice-presidência da República pela chapa do PCB, liderada por Roberto Freire. Nesse perÃodo, o partido passava por renovações internas provocadas pelas discussões acerca da queda do muro de Berlim e da ruÃna do socialismo no Leste Europeu. Com discursos que defendiam a reforma tributária, entre outras prioridades, o PCB obteve no pleito daquele ano 769.123 (1,06%) votos, ficando em oitavo lugar na corrida presidencial, à frente de partidos como o Partido da Frente Liberal (PFL), que tinha como candidato o ex-vice-presidente da República Aureliano Chaves. No segundo turno da eleição de 1989, o partido apoiou a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva.
A atuação constante na defesa da saúde pública rendeu a Arouca um eleitorado fiel, amplamente ligado à s questões sanitárias e a setores acadêmicos e cientÃficos. Esse público ajudou o médico a se eleger como deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro na legenda do PCB em outubro de 1990 com quase 94 mil votos. Empossado em fevereiro de 1991, ele se tornou um dos membros da Comissão de Seguridade Social e FamÃlia da Câmara dos Deputados.
Mas Arouca não estava satisfeito com o partidão. Durante o 9º Congresso Nacional do PCB ocorrido naquele ano, alinhou-se a um grupo que defendia mudanças radicais no estatuto e no programa do partido, com o objetivo de adequá-los à nova realidade nacional e mundial. As propostas renovadoras avançavam na medida em que os principais dirigentes do PCB assumiam publicamente idéias opostas. A estrutura do partido estava em crise. Dessa forma, no 10º Congresso pecebista, convocado extraordinariamente para janeiro de 1992, decide-se pela cisão do partido. Arouca foi um dos criadores do Partido Popular Socialista (PPS), que ficou com a maioria dos membros, favorável às mudanças. O PCB passou a ser dirigido pela corrente minoritária do partido. Arouca saiu do PCB em 1992.