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Sergio Arouca chegou à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) como pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) — que mais tarde recebeu seu nome — em 1976. Ele entrou no Programa de Estudos Socioeconômicos em Saúde (Peses), elaborado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) com o objetivo de apoiar institucionalmente a pesquisa em medicina social. No ano anterior, ele defendera sua tese de doutorado em medicina preventiva, O dilema preventivista, considerado um marco que deu início à teoria social da medicina no Brasil.

Pelo Peses, ele desenvolveu um programa de pesquisas que além de produzir pesquisas, funcionava como uma forma de apoiar vários grupos que estavam desenvolvendo projetos alternativos. mandavam bibliografia para esses grupos, ajudavam financeiramente e discutiam políticas a respeito de seus trabalhos.

O Projeto Montes Claros é uma dessas iniciativas. Ele começou como um internato rural da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, que tinha o objetivo de mandar os alunos para viver a realidade de um local extremamente pobre no Vale do Jequitinhonha. Com o tempo, ele passou a ser um projeto de organização do sistema de saúde na região norte de Minas Gerais, e extrapolou a área de atuação da universidade, começando a enfrentar obstáculos, como os impostos pelo Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) e pelo Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). A partir de um seminário realizado em Belo Horizonte, o grupo passou a ganhar apoio externo, como o do projeto da Ensp.

O Peses costuma ser definido como uma efervescência de idéias e propostas que norteou muitos médicos recém-formados e formou pessoas no campo da medicina social, em um momento em que esse tipo de pensamento era muito perseguido. Havia uma lista de mais de 70 nomes de comunistas que estavam nas instituições e nas universidades. Pensar, principalmente com uma abordagem marxista, era proibido.

Cerca de dois anos depois de sua entrada na Escola Nacional de Saúde Pública, a partir dos frutos científicos e políticos originados no Peses, Arouca prestou concurso para professor titular do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde (DAPS). Esse era um dos episódios que ele mais gostava de contar. Na ocasião, ele disputou a vaga com um coronel-médico e dizia que teve de passar por um verdadeiro “corredor polonês” formado por militares uniformizados, com todas as suas patentes a brilhar, para chegar à sala onde foram realizadas as provas.

Ao ser aprovado, ele passou a atuar como professor de planejamento, sem abandonar os projetos desenvolvidos no Peses. Suas aulas eram mais voltadas para o campo da política de saúde. Discutiam-se ali todos os projetos elaborados pelo Peses, as instituições de saúde, os ministérios, as organizações, a centralização etc.

O DAPS era um espaço de discussão e crítica, entre as quais, a desenvolvida contra a metodologia de planejamento organizada pelo Centro de Estudos do Desenvolvimento (CENDES) da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Esse centro seguia um método absolutamente normativo, que se baseava em cálculos para poder definir, por exemplo, a quantidade de médicos que eram precisos em determinado lugar, quantas horas eles tinham de trabalhar, quantas consultas eles dariam e em que áreas atuariam.

Como o Cendes se propunha a ser extremamente técnico, não levava em consideração o contexto político, o que interferia para que sua programação nem sempre desse certo. Além disso, dentro dessa metodologia, existiam cálculos de atribuição de valor à vida humana. Nessa época a Ensp começava a receber uma série de pesquisadores exilados da Argentina e do Chile e eles faziam uma crítica a esse sistema, tanto no exercício da docência, como na hora de apoiar e fazer assessoria de projetos.

Como professor, Arouca costumava ser definido como cativante. Suas aulas partiam sempre de exemplos simples e cotidianos, que faziam com que teorias complexas fossem facilmente compreendidas. Ele gostava de contar histórias e relatava casos de forma sábia e divertida, extraindo deles o aprendizado essencial. Em 1981, ele se afastou da Ensp a convite da Organização Pan-Americana da Saúde, para atuar como assessor na Nicarágua.

Ao retornar ao país em setembro de 1982, Arouca assumiu a chefia do Departamento de Administração. Durante algum tempo seu trabalho foi contar como tinha sido a experiência na Nicarágua, envolver-se novamente nos cursos de planejamento e assumir suas funções como chefe. Em 1984, começa o movimento pelas Diretas Já. Constitui-se, junto com esse movimento, um corpo de idéias dentro do setor saúde para a redemocratização.

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